As pedras no meio do caminho de Érica Manjate
No meio do caminho tinha uma pedra. A “frase verso” anterior abre um famigerado poema de Carlos Drummond de Andrade. E repete-se, sempre nesta mania dos poetas em disfarçar a complexidade na alegria das palavras simples. A graça da simplicidade, como diria outro poeta brasileiro, Olavo Bilac. A pedra é metáfora e a metáfora tem as cores das vidas de quem lê. No meio do caminho de Érica Manjate também tinha uma pedra. Na verdade, várias. Mas não as de cinza-obstáculo de Drummond. Pedras cujas cores fazem-nas objecto de culto. ‘‘Via a minha mãe adornada com pedras e achava muito bonito. Queria perceber de onde aquelas pedras vinham e como eram formadas’’.
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Também como Drummond, Érica nunca se esqueceu desse acontecimento. Drummond fez um poema, Érica um empreendimento. Érica é Rikka, a marca de jóias com o selo made in Mozambique. Drummond e Érica. Palavra e pedra. E este exercício de lapidar a matéria bruta até chegar ao poema e à jóia. Mas este é o presente. Há um passado de sonhos esquecidos em nome da carreira da formação. Fez Gestão de Turismo e trabalhou por conta própria em Turismo de Recepção. Mas a instabilidade militar, entre 2013 e 2014, tornou o país um destino de risco. ‘‘Acabei perdendo os contratos que tinha’’, conta. E o período em suspenso durante o qual não tinha o que fazer e não sabia o que fazer abriu as cortinas do passado. Outra vez, as pedras.
Foi para a Tanzânia aprender sobre gemologia. Regressada a Moçambique, começou apenas por vender pedras brutas. ‘‘Mas pensei que o país perdia muito, porque era tudo exportado em bruto’’, expressa. Então começou a lapidar e a estudar joalharia, com envolvimento de prata e ouro. E o déjà vu! Lembrou-se da mãe, das actrizes que via nos filmes e nas novelas, com colares de esmeralda, rubi e topázio. ‘‘A refracção era tão intensa’’, diz, e, com a distância do tempo, ainda percebemos o brilho no olhar dela.
Conta já com uma carteira de clientes diversificada que buscam na Rikka autenticidade. Os clientes ultrapassam as fronteiras de Moçambique e chegam à Argélia, Egipto, França, Portugal e África do Sul. Ao tempo que se torna a ideia e mão a vestir o pescoço, pulsos e orelhas de mulheres – mas também de homens – acaba por tirar o véu que sempre esteve envolto nas pedras. ‘‘A missão da Rikka é dar a conhecer os nossos recursos minerais’’, indica. E, para isto, também contribui muito o trabalho de análise e certificação de pedras que tem estado a fazer.
Edição 83 MAR/AGO| Download.
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