Hugo Mendes – Identity is in the trait
“Sunday Nood” e “Nirivalele hi Kuxwela’’. Duas exposições separadas por quatro anos. Reconhecemos o traço, mas não o estilo. Se na primeira explorava o corpo – feminino – como uma forma de exorcizar velhos fantasmas; na segunda, experimenta um universo onírico, convocador da mística quotidiana que reconhecemos enquanto moçambicanos. O nome é o mesmo: Hugo Mendes, que também tem ajudado a mudar a paisagem urbana de Maputo, como agora com a intervenção no viaduto Alcântara dos Santos.
Como é que foi definido o traço da tua identidade artística?
Foi tudo resultado de experiências, influências e outras coisas que fui vendo ao longo do tempo. Procuro representar algo que me identifique. Por isso, meus personagens tendem a ser negros e a temática dos meus trabalhos tendem a estar voltados a cultura moçambicana.
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Uma das tuas maiores referências é Matias Ntundo. Tens a preocupação de colocar a tua arte a dialogar com a dele?
Nunca fiz um exercício consciente de colocar a minha arte a dialogar com a arte dele. Vejo mais a forma como ele aborda certos aspectos. Ponho-me a pensar qu’ ele é um escultor e ataca a arte do printmaking de ilustração com a visão de um escultor e não com a visão de um desenhista. Tento também fazer isso com o meu trabalho, atacá-lo de formas diferentes. Por isso que não tenho apenas referências de artistas que desenham ou pintam, mas também da fotografia e do cinema. No caso específico de Matias Ntundo, é a forma como ele representa a cultura maconde que me fascina.
Já são duas exposições. “Sunday Nood” de 2018 e “Nirivalele hi Kuxwela’’ de 2022. Foram exposições já definidas a princípio?
Tudo começa com um quadro, quando acho que tenho algo feito que diz algo para mim, diferente de todos os outros. A exposição acaba por ser consequência das obras. Quando faço as obras, tento ser conceptual. Quando dou um passo para trás e percebo que há conexões entre elas, a partir daí dá para pensar em montar uma exposição com base nessas conexões.
Em “nirivalele hi kuxwela’’, apesar de encontrarmos talvez a mesma técnica de “Sunday Nood” , percebemos outros contornos do teu traço. Foi propositado?
As obras para essa exposição nasceram durante o período de isolamento por conta da pandemia. E tentei fazer um exercício de mudar um bocadinho o meu estilo. Ao invés de apresentar figuras assim tão humanas, tão reais, tentei fazer algo mais surreal, mais do mundo dos sonhos. Esse, se calhar, foi o primeiro conceito da exposição. E acabou também por ser especial por conta da instalação. Eu não queria aquele visual estéril, típico de galeria. Quis que as pessoas entrassem e se sentissem parte das obras.
Como este traço da instalação, que também nos lembra o traço feito para o Festival Azgo, chegou?
Criei o padrão sem nenhuma pretensão. Gosto de imaginá-lo como marcas tribais. E ser parte de uma edição do Festival que celebrava o Afroturismo foi especial. Mas não foi a primeira vez que pensei no Afroturismo. Fiz a capa do “Used to be african” dos Cacique 97, a ideia era pensar como seria se um país africano tivesse um astronauta e mandasse para o espaço. E fiz um astronauta com tatuagens macondes. E é isso que quero, elevar o meu país aos mais altos patamares. Não sou maconde. Mas sinto-me maconde. Não quero que Moçambique seja apenas um asterisco na história de arte.
Procuro representar algo que me identifique. Por isso, meus personagens tendem a ser negros e a temática dos meus trabalhos tendem a estar voltados a cultura moçambicana.
Edição 81 Out/Nov/ Dez| Download.
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