Cidade de Nampula – KUSHUKURO
Lembro-me ainda com o coração a borbulhar daquela noite que nada dormi de tanta ansiedade. Em mais algumas horas, ia descobrir um “mundo novo”. O destino era Nampula, terra das muthianas oreras, mucosos, missangas e feijões de tudo quanto é tipo. Mas não se chega à cidade sem se deliciar pelo Incomáti, Bazaruto, o Índico com os seus diferentes nomes, montanhas e indescritíveis paisagens que, vistas à moda drone, fazem-nos repensar sobre um ser supremo, seja qual for. Mas, afinal, não era tudo isto a melhor parte. O melhor dos lugares são as pessoas.
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Logo a chegar, conheci o que viria a ser um grande amigo, o meu moto-taxista particular que já nem me ocorre o nome, mas as lembranças das nossas aventuras por Nampula são inesquecíveis. Porquê relembrar disto? É que não se pode pensar na cidade de Nampula sem os moto-taxistas. É com buzinadas estrondosas e algazarra desmedida que se começam e terminam os dias. Mais digo-vos: aquele malabarismo que se tem de fazer para atravessar a estrada é memorável. É como se fôssemos expostos a uma parede e eles todos, os taxistas, tivessem-nos como alvo. Uma loucura. É por essas andanças em moto-taxi que se vislumbram capulanas de todas as qualidades e cores. Assistem-se pessoas a hora da ponta das mesquitas, todos em cofiós e jubós. É também por aí que se vêem os gémeos, não os comuns dois, mas milhares desde a rua dos bombeiros, do hospital central e bem próximo da Escola Lótus. Estes irmãos, sempre em vestidos e, como se todos os outros estivéssemos invisíveis, só falam com os outros gémeos. Nas andanças por Nampula, isto nem é o mais exótico. Há ali alguma coisa de invulgar naqueles rostos que já em tenra idade tem o brilhante brinco no nariz e a síndrome de: e se também furasse o meu? Poucas não a têm.
Houve dias em que me apanhava distante em pensamentos, afinal, andava por Nairuco. Um complexo de tirar o fôlego que se descobre há uns 30 minutos, ou menos, do Waresta. O idílico do Nairuco lembra o Éden.
O idílico do Nairuco lembra o Éden.
A cidade de Nampula é o melhor lugar para iniciar viagens pela literatura moçambicana e não só. Há, nas principais avenidas, jovens muito animados com livros a preço de banana. Com sorte, consegue descontos inconcebíveis para livros em primeira mão, pois grosso deles não o são. Andas pelos Xicandarinhas, Magustanas, Ualalapis, Xigubos, sem gastar o teu último mil.
Há um Museu por se descobrir, diz-se que foi o primeiro a ser construído fora da capital. Se é verdade? Só passando por lá. Para mim, o melhor do Museu é o que está atrás dele. Um grupo de jovens, adultos e velhos junta-se a trabalhar missangas, pau-preto, capulanas, palha e uma infinidade de coisas que deixam o lugar com um charme irresistível para fotos e, porque não, levar um pouco de Nampula para casa. Uma esquina a não perder também é a Galeria da Arte Makonde, que, com diversidade de ferramentas, permitem apreciar e fazer esta arte típica.
Depois das minhas caminhadas rumo ao novo que a cidade de Nampula oferece, não posso deixar de descrever um fenómeno multicolor que se pode viver nas comunidades: as cerimônias tradicionais. Não se pode passar por Nampula sem se ver de perto o Muali que é uma prática para raparigas depois da menarca. É, sem dúvidas, uma paragem obrigatória porque permite desmistificar, desconstruir e repensar práticas culturais que, pelo contacto com outras culturas, acabam sendo vistas com malícia.
Enfim, a cidade das muthianas oreras extravasa sorrisos bonitos, jubós, missangas de cintura, simpatias e noites ardentes: é história. São estórias, essências, profundidades, raizes, é vida. Kushukurémo-nos sempre.
A cidade das muthianas oreras extravasa sorrisos bonitos, jubós, missangas de cintura, simpatias e noites ardentes: é história
▶ Como ir
De Maputo a Nampula leva-se apenas 2h, via Linhas Aéreas de Moçambique. De autocarro, são dois dias de viagem.
▶ Onde dormir
Um ambiente aconchegante e descontraindo é o Ruby, com opções de actividades artísticas gratuitas diariamente no seu jardim. Para quem queira algo maior, o New Hotel oferece um serviço incomparável.
▶ Onde comer
No Delicato tem uma diversidade de doces por experimentar e se apaixonar. Para quem queira algo mais sofisticado e um ambiente mais elegante, pode dirigir-se ao Mood, com opção de música ao vivo à quinta-feira.
▶ Cuidados a ter
Tenha um taxista de confiança, pois a partir das 19h, não há chapas e nem se pode subir um táxi qualquer.
Edição 76 Nov/Dez| Download.
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