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Texto: Elton Pila

Foto: Ricardo Franco

Edição 71 Jan/Fev | Download.

Inter-religiosidade na Ilha de Moçambique – Educar pelo exemplo

Depois do primeiro nascimento, segue-se o segundo, que se dá com o registo civil. Um nome, um dia, um mês, um ano, um pai e uma mãe, tudo cravado em um papel como se fosse a confirmação da existência. O nome é Háfiz Jamú; o dia, o mês, o ano, o nome do pai e da mãe lá estavam. Mas a mãe analfabeta não podia deixar a assinatura, o que impedia a oficialização do registo. O pai alfabetizado e muçulmano praticante pensou em pedir ajuda a dois amigos – um padre católico e um líder hindu – para que servissem de testemunhas. E assim foi o segundo nascimento de Háfiz, filho de muçulmanos e “apadrinhado” por um católico e um hindu, um nascimento inter-religioso que continua a reverberar tantos anos depois.

Háfiz, Adérito e Parth materializam este lugar-comum na Ilha de Moçambique, a inter-religiosidade.

Já Jamú um sheik da confraria Qadiryya Baghdad está nas ruelas pejadas de história da Ilha de Moçambique a caminhar com um padre e um líder hindu. O católico é Adérito Emílio Pedro e o hindu é Parth Josh. Os três materializam este lugar-comum na Ilha de Moçambique, a inter-religiosidade. As roupas que vestem, que marcam logo a diferença, não são uma cortina de ferro entre eles. Se o mundo contemporâneo marcado pelos extremismos tende a colocar cada religião como uma ilha, a inter-religiosidade na Ilha é sempre esta espécie de ponte ou um braço esticado em direcção ao outro. “O Háfiz é meu irmão. O Parth é meu irmão. Somos todos irmãos” – Adérito.

A religião que professam é um atalho a algo maior que partilham: tornar o mundo um lugar melhor para viver. E num espaço como Ilha, com 97% dos habitantes a professar a religião islâmica e outros 3 % outras religiões, entre católicos, hindus e evangélicos, o exemplo deles torna-se ainda mais importante. “É necessário que as pessoas percebam que, apesar dos muçulmanos serem a grande maioria, existem outras religiões, que é preciso respeitar” – Háfiz.

Aqui, a caminharem juntos são um exemplo, sobretudo para as crianças, que começam agora a entender o mundo, dentro das bolhas que as crenças familiares involucram, mas que ao os verem no dia-a-dia aprendem que o outro é extensão de nós próprios. “Apesar de não termos uma grande comunidade hindu aqui, a convivência com as outras religiões é saudável” – Parth.

A crença neles não é um dogma, é um caminho para chegar ao mesmo destino em que se voltam a abraçar.

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