É uma tarde fresca de Primavera e Fernando P. B. chega ao Café Central carregando debaixo do braço um pão com chouriço do tamanho de uma raposa. Vê os três forasteiros sentados numa mesa da esplanada e pergunta se quererão uma fatia de pão. Dobrados sobre um prato de caracóis, os estranhos deliciam-se com o suco dos bichos regado a orégãos e alho, mais algum ingrediente secreto que nunca chegarão a descobrir. Ainda o medronho não chegou à mesa, mas, depois de meses de confinamento, qualquer cerveja é suficiente para animar a conversa. Entretanto, Leonel “Rouba-a-Rir”, dono do café localizado na praça principal de Odemira, na região portuguesa do Alentejo, chega com mais uma rodada. Não demora para que o medronho, o famoso medronho do Alentejo, entre em cena: aguardente de receita caseira, provavelmente capaz de matar qualquer vírus que sonhe sequer em aproximar-se. Todos se levantam e quase se abraçam, mas não é tempo disso. Cada um na sua mesa e com a devida distância social, levantam o braço para um brinde esticado ao centro, de estranhos acabados de se fazer amigos que nunca mais voltarão a ver-se. O pretexto eram os caracóis, mas mais tarde alguém diria: “Começámos nos tremoços e acabámos no medronho”. Há coisas que só vividas – o convívio alentejano é uma delas.
Texto: Cristiana Pereira
Foto: Vasco Célio
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